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DIREITO DO CONSUMIDOR: DOUTRINA


28 de Julho de 2009

A Tutela Penal dos Direitos Autorais

 



SUMÁRIO: A Tutela Penal dos Direitos Autorais. 1. Generalidades. 2. Violação de direito autoral. 2.1. Evolução histórico-normativa do direito pátrio. 2.2. Objetividade jurídica. 2.3. Sujeitos ativo e passivo. 2.4. Elementos objetivos. 2.5. Elemento subjetivo. 2.6. Pena e ação penal. 2.7. Figuras típicas qualificadas. 2.7.1. Reprodução com o intuito de lucro. 2.7.2. Comercialização de obra intelectual. 2.7.3. Violação constitui no oferecimento ao público. 2.8. Exceções ao direito do autor. 2.9. Pena e ação penal.

 

1. Generalidades

A atividade intelectual faz surgirem novos bens no grupamento societário, caracterizados por serem coisas incorpóreas. Apregoe-se, contudo, que só com o surgimento dos meios mecânicos que possibilitaram a reprodução de uma obra com número ilimitado de exemplares acordou o legislador em razão do objetivo lucrativo da atividade. O velho Direito romano, na visão de Scialoja, já se preocupava em defender por meio da actio iniurarum a propriedade intelectual. Assim sendo, os grandes investimentos no campo passaram a exigir uma tutela protecionista em razão dos concorrentes, que nasce em favor do editor, olvidando o papel do autor, com atuar de natureza monopolista.

O marco na relação entre o autor e a sua obra ocorre com a invenção da tipografia por Johann Gutenberg (1390-1468), em Mainz, onde a literatura era até então manuscrita e sob o controle do clero, passando a ser reproduzida em larga quantidade através do trabalho gráfico da imprensa. Assim, com o aparecimento dos tipos móveis, em meados do século XV, a forma escrita fixa-se e as idéias atingem escala comercial. A partir daí, aparece o questionamento dos direitos autorais, a proteção e a remuneração dos autores. Em 1662, a Licensing Act proibia a impressão de qualquer obra que não estivesse registrada, que consistia em uma forma de censura, pois não se licenciavam livros que ofendessem o licenciador.

Pessina cita que foi Pietro di Ravenna na República de Veneza (5.1.1491) o mais antigo canonista a ter reconhecido pelos governadores seu privilégio pessoal de exploração.

A conquista da proteção do direito do autor é lenta e gradual, fixando-se os marcos de evolução em um copyright (palavra inglesa, de uso internacional, indicativa de propriedade literária em direito autoral e que, no frontispício da obra ou, mais geralmente, no seu verso, acompanha o nome do beneficiário e o ano da primeira publicação, para os efeitos legais), em favor dos autores, através da English Copyright Act da Rainha Ana da Inglaterra,100 passando pela Revolução Francesa, até a consagração de sua amplitude na legislação americana. Foi a Revolução Francesa (1789) que, através da Loi Lakanal, rompeu as práticas monopolistas, reconhecendo a plena liberdade de criação dos escritores, bem como o direito subjetivo à exploração exclusiva de suas obras. Aliás, através de uma Ordenação Real (1777), a França já tinha definido a propriedade vitalícia do autor da obra, proibindo sua falsificação. O droit d’anteur era uma extensão do direito da personalidade, pois questionava a regra do registro prévio, que veio a ser afastada no final do século XX, diante da adoção do sistema continental, que estabelecia a proteção independentemente de registro.

Na atualidade é a ferramenta jurídica padrão, administrada pela Organização Mundial de Proteção Intelectual (OMPI), que vige nos países que integram a Organização Mundial de Comércio (OMC). Assinale-se que a lei autoral brasileira é uma das mais modernas e foi promulgada sob a égide do TRIPS (Acordo sob Aspectos do Direito da Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio), firmado pelo Brasil no âmbito da Organização Mundial de Comércio.

A natureza jurídica da obra literária ou artística é assaz controvertida. A característica da reprodutividade responderia pela exigibilidade da tutela, em virtude de tratar-se de um bom produto de utilidade patrimonial. Não se pode comparar o autor com um vendedor ambulante, pois as criações do espírito são as idéias, e a obra literária e artística se caracteriza por ser humana (v.g.: o texto originário de um computador não é obra de arte ou literária).

Na velha discussão no plano doutrinário sobre a natureza jurídica do direito autoral, há os autores que defendem uma postura única de mero direito da personalidade os que advogam pura característica de direito patrimonial e aqueles que defendem uma posição sui generis, que não se confundiria nem com o direito de personalidade nem com o direito de propriedade. Segue-se que, no Brasil, o aspecto moral é destacado no Código Criminal de 1830, que instituiu o crime de contrafação, punido com a perda dos exemplares. Há uma Lei, a de 11.8.1827, que criou os cursos jurídicos de São Paulo e Olinda, dando o privilégio exclusivo aos lentes sobre compêndios de suas lições pelo prazo de 10 anos.

O direito autoral é um direito especial, sujeito a uma disciplina própria, com princípios e regras consagrados universalmente, com peculiaridades que o distinguem do complexo normativo dos demais direitos privados.

A obra intelectual jamais poderia ser considerada como bem de produção. O direito do autor, para alguns, seria um direito real sui generis, tendo por objeto a obra. Todavia, tal problemática não escapou à acuidade de J. O. Ascensão, quando leciona que “a qualificação do direito do autor como um direito exclusivo não está dependente da sua qualificação como direito pessoal ou patrimonial”.

A nosso aviso, inexiste uma verdadeira propriedade, sendo que a essência patrimonial se encontra na exploração econômica da obra. É que, sem dúvida, há um direito pessoal e um direito patrimonial.

Vê-se, assim, que o legislador criminal se houve com acerto ao não incluí-lo no pacote dos injustos patrimoniais, criando a rubrica relativa aos injustos contra a propriedade intelectual.

O direito do autor é o ramo do ordenamento jurídico que disciplina a atribuição dos direitos restritos a obras literárias e artísticas, ao passo que o direito autoral engloba os denominados direitos conexos aos do autor. O direito de autor pode ser objeto de renúncia, mas inexiste prescrição e torna-se impossível usucapi-lo. A natureza e o interesse coletivo criam limitações, ao menos do ponto de vista econômico, ao direito do autor, caindo a obra no domínio público, vencido o prazo de proteção post mortem (v.g.: a) obras em relação às quais vence o prazo de proteção; b) obras de autores falecidos que não tenham deixado sucessores; c) obras de autores desconhecidos, transmitidas pela tradição oral; d) obras publicadas em países que não participem de tratados aderidos pelo Brasil).


São previstos no capítulo relativo aos injustos contra a propriedade intelectual o injusto do tipo de violação do direito autoral (reprodução, comercialização, oferecimento ao público de obra com violação do direito autoral).

 

2. Violação de direito autoral

2.1. Evolução histórico-normativa do direito pátrio

As Ordenações Filipinas tratavam da impressão de livros sem licença do Rei (“Por evitarem os inconvenientes, que se podem seguir de se imprimirem em nossos Reinos e Senhores, ou de se mandarem imprimir fora delles livros ou obras feitas por nossos vassalos, sem primeiro serem vistos e examinados, mandamos que nenhum morador nestes Reinos imprima nem mande imprimir nelles, nem fora delles, obra alguma, de qualquer matéria que seja, sem primeiro ser vista e examinada pelos Desembargadores do Paço depois de ser vista e aprovada pelos Oficiais do Santo Ofício da Inquisição. E achando os ditos Desembargadores do Paço que a obra he útil para se dever imprimir darão per seu despacho licença que se imprima e, não o sendo, a negarão”).

O Código Penal de 1830,101 sob a rubrica furto, tratou entre os injustos contra a propriedade: “Imprimir, gravar, lithographar ou introduzir quaisquer escriptos ou estampas que tiverem sido feitos, compostos ou trazidos por cidadãos brasileiros, enquanto estes viverem e em dez anos depois da sua morte, sem deixar herdeiros. Penas – de perda de todos os exemplares para o autor ou traductor, ou seus herdeiros, ou, na falta delles, do seu valor e outro tanto, e de multa igual ao tresdobro do valor dos exemplares. Se os escriptos ou estampas pertencerem a corporações, a prohibição de imprimir, gravar, lithographar ou introduzir, deverão somente por espaço de dez anos.”

O Código de 1890 trouxe o primeiro desenvolvimento de natureza legislativa, ao tratar no Capítulo V, sob o título “Dos Crimes contra a Propriedade Literária, Artística, Industrial e Commercial”, na Seção I, sobre “Da Violação dos Direitos da Propriedade Literária e Artística”: a) imprimir, ou publicar em colleções, as leis, decretos, resoluções, regulamentos, relatórios e quaisquer actos dos poderes legislativo e executivo da Nação e dos Estados: Penas – de apphreensão e perda para a Nação ou Estado de todos os exemplares publicados ou postos à venda, e multa igual à importância do seu valor; b) reimprimir, gravar, lithographar, importar, introduzir, vender documentos, estampas, cartas, mappas e quaisquer publicações feitas por conta da Nação ou dos Estados, em officinas particulares ou publicas; c) reproduzir, sem o consentimento do autor, qualquer obra literária ou artística, por meio da imprensa, gravura ou lithographia, ou qualquer processo mecânico ou químico, enquanto viver, ou a pessoa a quem houver transferido a sua propriedade, e dez annos mais depois de sua morte, se deixar herdeiros; d) traduzir e expor à venda qualquer escripto ou obra, sem licença do seu autor; e) executar, ou fazer representar, em theatros os espetáculos públicos, composição musical, tragédia, drama, comédia ou qualquer outra produção, seja qual for a sua denominação, sem consentimento, para cada vez do dono ou autor; f) reproduzir qualquer produção artística sem consentimento do dono por imitação ou contrafacção).

As penas pela violação do direito do autor e dos direitos conexos eram as de apreensão, perda dos exemplares e de multa em favor do autor.

Com o surgimento da Constituição de 1891,102 a matéria ingressa em nível constitucional, consagrando o direito exclusivo de reprodução ao autor e seus herdeiros. A Lei nº 496, de 1º de agosto de 1898, define e garante os direitos autorais e revoga os arts. 342 e 343 (este que versava sobre a solidariedade entre o dono da oficina, autor ou importador, e o vendedor) do Código de 1890; e o Código Civil de 1916103 tratava “Da Propriedade Literária, Científica e Artística”, sendo o direito do autor protegido durante toda a sua vida, e por mais um prazo de 60 anos em favor de seus herdeiros.
Somente a Carta de 1937 olvidou a tutela constitucional.

A Constituição Federativa de 1988 estabelece que pertence aos autores o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar,103A bem como são assegurados nos termos da lei: a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas; b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas.103B

O Código Penal de 1940 regulou a matéria, excluindo do conjunto dos injustos patrimoniais, tratando no capítulo referente aos injustos contra a propriedade intelectual: “Violar direito de autor de obra literária, científica ou artística: Pena – detenção de três meses a um ano, ou multa de mil a cinco mil cruzeiros.” Parágrafo único: “Na mesma pena incorre quem vende ou expõe à venda, adquire, oculta ou tem em depósito, para o fim de venda, obra literária, científica ou artística, produzida com violação de direito autoral.”104

O Código Penal de 1969 tratava da “Violação de Direito Autoral ou Direitos Conexos” (“violar direito de autor ou direitos conexos previstos em lei”).105

Os arts. 184 e 186 do Código Penal de 1940 recebem nova redação pela Lei nº 6.895, de 17 de dezembro de 1980 (“Art. 184. Violar direito autoral: Pena – detenção de três meses a um ano, ou multa de dois mil a dez mil cruzeiros. § 1º Se a violação consistir na reprodução, por qualquer meio, de obra intelectual, no todo ou em parte, para fins de comércio, sem autorização expressa do autor ou de quem o represente, ou consentir na reprodução de fonograma e videofonograma, sem autorização do produtor ou de quem o represente: Pena – reclusão de um a quatro anos e multa de dez mil a cinqüenta mil cruzeiros. § 2º Na mesma pena do parágrafo anterior incorre quem vende, expõe à venda, introduz no País, adquire, oculta ou tem em depósito, para o fim de venda, original ou cópia de obra intelectual, fonograma ou videofonograma, produzidos com violação de direito autoral.(...) Art. 186. Nos crimes previstos neste capítulo somente se procede mediante queixa, salvo quando praticados em prejuízo de entidade de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo Poder Público, e seus casos previstos nos §§ 1º e 2º do art. 184 desta Lei”).

Anote-se que a Declaração Universal dos Direitos do Homem consagra em seu art. 27: “1 – Toda pessoa tem direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de gozar das artes e de participar do programa científico e dos benefícios que dele advenham. 2 – Toda pessoa tem direito à proteção dos interesses morais e materiais que lhe correspondam por motivo das produções científicas, literárias ou artísticas de que seja autora.” No plano internacional, proliferam os tratados bilaterais. É indubitável o relevante papel da Associação Literária e Artística Internacional, criada em 1878, e sob cujos auspícios foram celebrados os congressos de Lisboa (1880) e de Viena (1881), e principalmente o de Roma (1882), no qual foi redigido o Projeto de Convenção que originou a Convenção de Berna. O primeiro grande acordo é a Convenção de Berna (1886), que é padrão, caracterizado pelo protecionismo. Administrada pela Organização Mundial de Propriedade Intelectual, a Convenção de Berna foi revista em Estocolmo (1967) e objeto de nova revisão em Paris (1971). Podemos ainda citar a Convenção Universal do Direito do Autor, aprovada em Genebra (1952) e revista em Paris (1971). A Convenção de Roma para proteção de artistas e intérpretes ou executantes foi administrada pela Unesco (1961). O Brasil aderiu e ratificou quase todos os tratados, acordos ou convenções na área específica.

O anteprojeto de 1984 fez diversas modificações em relação aos injustos contra a propriedade intelectual. Inicialmente, sob a rubrica “Violação de Direito Autoral”, a norma reitora passa a ter a seguinte redação: produzir ou reproduzir obra intelectual com violação de direito autoral”; e passa a ter um parágrafo único que diz que a pena é aumentada até o dobro, se a produção ou reprodução de fonograma ou videofonograma é para fins de comércio, bem como se o agente vende, expõe à venda, introduz no País, adquire, oculta ou tem em depósito, para fim de venda, original ou cópia de obra intelectual, fonograma ou videofonograma, produzido ou reproduzido com violação de direito autoral. Inclui-se, ainda, a usurpação de nome ou pseudônimo alheio.


Entendemos que a expressão direito autoral engloba os chamados direitos conexos do direito do autor.

A Constituição Federativa de 1988106 regula a propriedade intelectual em duas normas distintas: a) aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação, reprodução de suas obras; b) esse direito é transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar. A Carta Republicana assegura os direitos do autor de obra intelectual, reconhecendo-lhe o direito de propriedade intelectual (obras literárias, artísticas, científicas e de comunicação).

O projeto Alcântara Machado previa sob a rubrica “Dos crimes contra a propriedade imaterial”, abrangendo os injustos contra a propriedade industrial.

A Lei nº 8.635, de 16 de março de 1993, fez introduzir dois parágrafos ao art. 184 do Código Penal: “§ 1º Na mesma pena do parágrafo anterior incorre quem vende, expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire, oculta, empresta, troca ou tem em depósito, com o intuito de lucro, original ou cópia de obra intelectual, fonograma ou videofonograma, produzido ou reproduzido com violação de direito autoral. (...) § 3º Em caso de condenação, ao prolatar a sentença, o juiz determinará a destruição da produção ou reprodução criminosa.”

A Lei que regula os direitos autorais, estendendo-se essa denominação aos direitos autorais e aos que lhes são conexos, é a Lei nº. 9.610, de 19 de fevereiro de 1998.

O anteprojeto de 1999, no que concerne aos injustos contra a propriedade intelectual, estatui a rubrica da violação do direito autoral qualificada, que consiste: “I – utilização, por qualquer meio, de obra intelectual, no todo ou em parte, para fins de comércio, sem autorização expressa do autor ou de quem o represente; II – reprodução, fonograma ou obra audiovisual, sem autorização do produtor ou de quem o represente; III – transmissão ou retransmissão, não autorizada pelo produtor, de sons ou imagens.” Repete-se o texto do § 2º, do art. 184 do Código Penal. A resposta penal é muito menos aflitiva (Pena – detenção, de um a três anos, e multa). O injusto de usurpação de nome ou pseudônimo alheio também passa a ter uma sanção de detenção, de um mês a um ano, ou multa. Criminaliza o atuar sob o nomen iuris alteração de obra de criação alheia (“Modificar ou mutilar obra de criação alheia, prejudicando a reputação do autor”).

Com a edição da Lei nº 10.695, de 1.7.2003, foi revogado o art. 185 do Código Penal que definia o injusto de usurpação de nome ou pseudônimo alheio e fez acrescentar ao art. 184 do Código Penal o § 4º (“O disposto nos §§ 1º, 2º e 3º não se aplica quando se tratar de exceção ou limitação ao direito do autor ou os que lhe são conexos, em conformidade com o previsto na Lei nº. 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, nem cópia de obra intelectual ou fonograma, em um só exemplar, para uso privado do copista, sem intuito de lucro direto ou indireto”).


2.2. Objetividade jurídica
O direito autoral, que engloba o direito do autor e os chamados direitos conexos do direito do autor (direitos dos artistas, intérpretes ou executantes, dos produtores de fonogramas e dos organismos de radiodifusão), disciplina a atribuição de direitos relativos às obras literárias, científicas e artísticas.

O objeto jurídico é o direito autoral, objetivando a proteção da exploração econômica (garante ao criador o direito de ter o seu nome impresso na divulgação de sua obra e o respeito à indignidade desta, além de lhe garantir os direitos de modificá-la, ou mesmo impedir sua circulação) e moral (regula as relações jurídicas da utilização econômica das obras intelectuais) da obra. Como vimos, a característica da reprodutividade reclama a tutela legal.

O objeto de direito autoral situa-se no caráter criativo, pouco importando o mérito da obra, salvo na hipótese de constituir ilicitude penal (pornográfica ou obscena). Ensina com propriedade Paulo José da Costa Jr. ser “essencial que a obra surja como resultado de uma atividade que tenha trazido para o mundo exterior algo que antes não existia. Nisto consiste a originalidade."

e resto, se não há criação, não há objeto a ser tutelado.

O objeto material da ação são as obras intelectuais protegidas, incluídos os textos de obras literárias, artísticas ou científicas (conferências, alocuções, sermões, obras dramáticas e dramático-musicais; coreográficas, audiovisuais, cinematográficas, fotográficas, desenho, pintura, gravura, escultura, litografia, arte cinética, ilustrações, mapas, projetos, esboços, adaptações, traduções; programas de computador, coletâneas, analogias, enciclopédias, dicionários, base de dados, enfim, uma criação intelectual). Na avaliação do objeto, a criação e a originalidade caracterizam a obra intelectual. Se já existia obra idêntica, não há aquisição de direitos. Ao autor de obra análoga incumbirá o ônus da prova, visto que o registro, a divulgação ou a publicação criam a presunção em relação à originalidade.

Ao contrário da Consolidação das Leis Penais, que em seu art. 342 estatuía quais os direitos autorais, na legislação pátria em vigor é norma penal em branco, tendo como fonte completiva a Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Não se pode olvidar o caráter de vitaliciedade dos direitos patrimoniais do autor.

Trata-se de tipo comum, comissivo, de forma livre, doloso, de lesão (distribuição, venda, locação, aquisição) ou de mera conduta (ocultação ou introdução de fonograma no país; ou no oferecimento ao público), instantâneo ou permanente (ocultação, depósito ou exposição à venda), plurissubsistente e unilateral. Na hipótese de várias representações teatrais sucessivas, execuções orquestrais, edições ou tiragens de livros ou discos, configura-se o crime continuado. Admite-se a tentativa.107

2.3. Sujeitos ativo e passivo

O sujeito ativo pode ser qualquer pessoa que viole direito do autor ou que lhe for conexo. Como ensina J. O. Ascensão: “O direito do autor caracteriza-se em faculdades de caráter patrimonial e em faculdades de caráter pessoal." Admite-se a co-autoria com o editor, empresário da representação, atores, vendedores, desde que atuem com a consciência da ilicitude do obrar, lesionando os direitos morais e patrimoniais do titular sobre a obra intelectual produzida.

O sujeito passivo é o autor da obra, criador de obra literária, artística ou científica, que pode se identificar através de seu nome civil completo ou abreviado, iniciais, pseudônimo ou qualquer outro sinal convencional, cujos direitos morais são inalienáveis e irrenunciáveis, seus herdeiros e sucessores, bem como a pessoa jurídica, como concessionária ou sucessora dos direitos autorais.108 Cabe ao autor o direito de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica, bem como pode autorizar sua utilização ou fruição, no todo ou em parte, por terceiros (pessoa física ou jurídica).

Tratando-se de obra anônima ou pseudônima, caberá a quem publicá-la o exercício dos direitos patrimoniais do autor.108A A omissão do nome do autor, ou de seu co-autor, na divulgação da obra não presume o anonimato ou a cessão de seus direitos.108B

Com a edição da Lei nº. 10.695/2003 foi ampliado o espectro normativo de proteção complementativa da norma penal em branco, incluindo os artistas intérpretes (cantores, atores de peças teatrais e televisivos) e executantes (músicos de orquestra ou banda). Diz o legislador que o autor que alienar obra de arte ou manuscrito, sendo originais os direitos patrimoniais sobre a obra intelectual, tem direito irrenunciável e inalienável a participar da mais-valia que a eles advierem, em benefício do vendedor, quando novamente alienados. Se é caso de obra anônima ou pseudônima, os direitos autorais cabem a quem publicá-la. Os direitos patrimoniais do autor extinguir-se-ão por toda a vida e será de setenta anos109 o prazo de proteção sobre as obras anônimas ou pseudônimas, contado de 1º de janeiro do ano imediatamente posterior ao da primeira publicação. Advirta-se que os direitos do autor podem ser cedidos a terceiros, a título universal ou similar.

Não é sujeito passivo o revisor, atualizador, executivo da edição ou apresentador. Contudo, na obra cinematográfica são co-autores o autor do assento ou argumento literário, musical, o diretor e o produtor.

Pode-se ter, na violação do direito autoral de uma mesma obra, vários sujeitos passivos, isto é, múltiplos cessionários ou concessionários, que substituem o autor no plano patrimonial (v.g.: o romance, adaptado, depois, para o teatro, cinema e televisão). É comum a coexistência de vários titulares e sucessores contratuais ao lado do autor da obra, que fica privado dos direitos correspondentes (v.g.: reproduções, traduções, adaptações, arranjos, ou melhor, em obras derivadas, ou de “segundo grau”). Sucede que nas hipóteses aventadas o sujeito passivo deixa de ser o criador, para ser o sucessor contratual, na condição de cessionário ou concessionário, obviamente, desde que tenha havido seccionamento total dos elos de ligação de seu criador. São sujeitos passivos os co-autores da obra (letrista, autor de argumento em trilha sonora, roteirista, diretor de obra cinematográfica, teatral ou encenação televisiva).

A proteção dos direitos autorais independe de registro, sendo facultativo; o autor pode e deve registrar a sua obra conforme a sua natureza na Biblioteca Nacional, na Escola de Música e de Belas Artes da Universidade do Rio de Janeiro ou no Conselho Federal de Engenharia e Agronomia.

Aduza-se que isso poderá operar-se nas seguintes hipóteses: a) transferência contratual, total ou parcial, por meio de doação ou cessão de direitos; b) oneração com vínculos reais, como no caso do penhor ou do usufruto; c) na sucessão legítima ou testamentária; d) no abandono ou perda do exemplar único; e) na prescrição; f) na desapropriação. Não é sujeito passivo aquele cuja obra tenha sido retirada de circulação por força de sentença transitada em julgado, pois fica impedido de exercer a titularidade dos direitos autorais.

Por fim, no caso de titulares derivados, a derivação plena ocorre somente em relação ao fenômeno naturalístico sucessório, pois ficam sempre mantidos os vínculos morais personalíssimos do autor, atribuindo-se ao Estado a defesa da obra que caiu no domínio público.

Os direitos morais e patrimoniais sobre sua obra pertencem ao autor que a criou, que tem o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou científica. Nada poderá ser reproduzido sem sua expressa e prévia autorização.

2.4. Elementos objetivos

A ação típica consiste em realizar a figura típica, isto é, violar (infringir, ofender, transgredir, descumprir, desrespeitar) o direito do autor e os que lhe forem conexos. A lei penal não define o que seja direito do autor e os que lhe são conexos. Trata-se de norma penal em branco. A norma completiva está na Lei nº. 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Os direitos conexos são os correlatos dos de autor, de artistas-intérpretes ou executantes, produtores fonográficos e as empresas de radiodifusão.110

Cogitando de direitos conexos ao direito do autor, figuram como sujeitos passivos os artistas-intérpretes (atores, cantores, bailarinos), produtores fonográficos e as empresas de radiodifusão.111


Entendemos que o autor, mesmo que realize contrato de cessão de seus direitos patrimoniais, mantém o seu direito moral sobre a obra. Trata-se de direito inalienável e irrenunciável, pois é um conjunto englobante dos elementos morais e pecuniários, dentro da tríplice característica (criatividade, originalidade e exterioridade). Nos países da common law, o copyright é direito de propriedade. Aduza-se que a pessoa jurídica pode ser titular de tais direitos. Na hipótese de não mais ser o autor ou o titular do direito de propriedade de exploração da obra o seu titular, a utilização está subordinada ao Conselho Nacional de Direito Autoral. A Constituição Federativa de 1988, em seu art. 5º, incisos XXVII e XXVIII, alíneas a e b, regula a matéria.

Os direitos morais111A do autor são: a) reivindicar, a qualquer tempo, a paternidade da obra; b) ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, na utilização da obra;111B c) conservá-la inédita; d) assegurar a integridade, opondo-se a quaisquer modificações, ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-lo, ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra; e) modificar a obra,111C antes ou depois de utilizá-la; f) retirá-la de circulação, ou cancelar-lhe qualquer forma de utilização já autorizada; g) ter acesso a exemplar único e raro da obra, quando se encontre legitimamente em poder de outrem, para o fim de, por meio de processo fotográfico ou assemelhado ou audiovisual, preservar a memória, de forma que não cause o menor inconveniente possível a seu detentor, que, em todo caso, será indenizado de qualquer dano ou prejuízo que lhe seja causado.

Outrossim, depende de autorização do autor de obra literária, artística ou científica a edição, a tradução, a adaptação ou inclusão em fonograma ou película cinematográfica, a comunicação ao público, a execução, representação, recitação ou declamação, radiodifusão, emprego de alto-falantes, videofonografia.

Ao artista, herdeiro ou sucessor, a título oneroso ou gratuito, cabe o direito de impedir a gravação, reprodução, transmissão, ou retransmissão, por empresa de radiodifusão, ou utilização de suas interpretações em execuções, quando não dado prévio e expresso consentimento. O produtor de fonogramas tem o direito de autorizar ou proibir-lhe a reprodução.

Visualizada a questão das limitações aos direitos do autor, constatamos ex lege que não constitui ofensa: a) a reprodução; b) os trechos de obras já publicadas ou, ainda que integral, de pequenas composições alheias no contexto de obra maior, desde que esta apresente caráter científico, didático ou religioso e haja a indicação da origem e do nome do autor; c) na imprensa diária ou periódica, de notícia ou de artigo informativo, sem caráter literário, publicados em diários ou periódicos, com a menção do nome do autor, se assinados, e da publicação de onde foram transcritos; d) no corpo de um escrito, de obras de arte, que sirvam como acessório para explicar o texto, mencionados o nome do autor e a fonte de que provierem; e) de obras de arte existentes em logradouros públicos; f) de retratos, ou de outra forma de representação da efígie, feitos sob encomenda, quando realizada pelo proprietário de objeto encomendado, não havendo a oposição da pessoa neles representada ou de seus herdeiros; g) a reprodução, em um só exemplar, de qualquer obra, desde que não tenha como objeto a utilização com fim de lucro; h) a citação, em livros, jornais ou revistas, de passagens de quaisquer obras, para fins de estudo, crítica ou polêmica; i) o apanhado de lições em estabelecimentos de ensino por aqueles a quem elas se dirigem, vedada, porém, sua publicação, integral ou parcial, sem autorização expressa de quem as ministrou; j) e, finalmente, a utilização de obras intelectuais quando indispensáveis à prova judiciária ou administrativa.

É considerada uma gravura de arte original aquela em que o artista que criou o desenho é o mesmo que realizou a gravação e, na maior parte das vezes, também a impressão. Não se deve confundir com a “gravura de reprodução”, que não é realizada pelo autor da gravura original.

A assinatura é uma afirmação do individualismo, e, nos primórdios, o ato de copiar uma gravura não era considerado plágio, mas sim o de colocar uma assinatura nessa cópia. Há inúmeros casos de reprodução feita por processo manual por mais de duas pessoas, assinadas e numeradas pelo artista criador do desenho, passando por original (v.g.: Rembrandt, em determinada chapa terminada por Seghers, denominada O anjo guiando Tobias, retira o anjo e Tobias e modifica a paisagem, acrescentando gravação sua, criando uma Fuga para o Egito).


Ainda que inexistisse norma legal que instituísse punição contra as violações do que se denominaria ser direito dos autores das obras intelectuais, sempre esteve presente a reprovação moral, que impunha o repúdio público do contrafator e a sua desonra e desqualificação nos meios intelectuais. A constatação de um plágio é questão complexa de difícil avaliação pelos peritos judiciais, diante das subjetividades e da imaterialidade características da propriedade intelectual.

A contrafação é a imitação fraudulenta de obra literária, científica ou artística, bem como de fonograma, não autorizada. Salienta Hungria a dificuldade da prova em relação a certas obras, mapas geográficos e topográficos, diante da inexistência de um trabalho criativo, restringindo-se tão-só a reprodução do que existe no mundo objetivo.112 O plágio (usurpação de autoria) se constitui no ato ilícito de imitar trabalho alheio, principalmente reproduzindo, no todo ou em parte, obra literária, científica ou artística de outrem, sem o seu consentimento ou omissão da fonte, como se fosse própria.113 Ensina Hungria que há necessidade de se distinguir entre “a imitação servil e a imitação remota ou fluida”, só ocorrendo quando há usurpação de trechos relevantes da obra alheia, ocasionando a reprovabilidade ético-jurídica. Escreve Hungria que “para identificação do plágio criminoso não deve o juiz colocar-se no ângulo de vista demasiadamente susceptível ou rigoroso da ética literária ou artística”. Assim, não se constitui em plágio a mera cópia ou reprodução servil, mas o aproveitamento da criação, apresentada com nova roupagem.114 Na lição de Hungria, “se o plágio se limita ao que os franceses chamam ‘larcins imperceptibles’, inexiste contrafação”; em síntese: “Plágio quando alguém usurpa, pelo menos, trechos importantes da obra alheia ou essenciais de sua estrutura ideológica.”115

No plágio ocorre a usurpação, ao passo que a contrafação caracteriza-se pela atuação sobre obra alheia não declarada como própria, ocorrendo mais no direito de reprodução.

Não se deve confundir o juízo de tipicidade penal na figura da apropriação indébita em relação à ação de apropriar-se ou utilizar-se indevidamente de obra alheia, porque o objeto material da ação no injusto do tipo de apropriação indébita, previsto no art. 168 do Código Penal, é coisa material e não imaterial.

A consumação varia com a modalidade (v.g.: publicação ou reprodução abusiva, exposição ao público, execução, representação). Sabemos que, ocorrendo a exposição de exemplares (critério temporal) para a venda, haverá crime permanente, e, na hipótese de edições ou tiragens, representações, execuções, exposições sucessivas, crime continuado. De seu turno, a mera reprodução consuma o injusto penal, abstraída a exposição à venda, embora no § 2º do art. 184, Código Penal, exija-se o recebimento do preço.

É admissível a tentativa. Apesar de tudo e de todas as advertências, há inúmeras publicações em que são feitas acusações de plágio no mundo da crítica literária e artística; porém, é deveras raro que se concretizem judicialmente e, mais ainda, com a procedência do pedido condenatório. Poderíamos aduzir, como vulnerabilidade às dificuldades probatórias, além do relativismo dos conceitos de imitação e originalidade, o grave risco de que as imputações de plágio se traduzam em imputação de calúnia, invertendo papéis.

Nem toda fotografia merece amparo legal, cabendo à perícia decidir sobre o aspecto de sua artisticidade, bem como se a sua utilização está condicionada a normas especiais. Quando o retratado é pessoa humana, são respeitados os seus direitos e a difusão do uso de reproduções, no que concerne à proteção de imagem. A Constituição Federativa de 1988 assegurou inclusive o direito de indenização por dano à imagem. É conhecida a decisão judicial de que o modelo fotográfico não é co-autor de obra fotográfica, não sendo detentor de direitos autorais. Entendemos que o modelo fotográfico pode ser sujeito passivo de injusto do tipo de violação do direito autoral, porque há a proteção à imagem, desde que a foto tenha artisticidade.

Enfim, como já foi dito, a lei civil inclui no conceito de direito autoral os direitos do autor e os direitos conexos, sendo que, sob o ângulo do Direito Penal, a reprovação do obrar incide na cópia ou reprodução abusiva, excluindo-se a imitação ou o aproveitamento de idéias, métodos ou sistemas criados originalmente pelo autor.

Nossos Tribunais corretamente excluem o modelo fotográfico como autor ou co-autor de obra fotográfica; porém, há possibilidade do concurso de pessoas quando o violador do direito for o editor do livro, o empresário da representação teatral, o produtor do CD, ou mesmo os atores, vendedores ou co-partícipes, desde que conhecedores da fraude.

2.5. Elemento subjetivo

O injusto de violação de direito autoral (caput) é punível a título de dolo, vontade livre e consciente de violar o direito do autor, inexistindo elemento subjetivo especial do tipo (animus lucri faciendi).

Há possibilidade de ocorrer erro do tipo, se o sujeito ativo imaginar que a obra já caiu no domínio público.

2.6. Pena e ação penal

A pena cominada ao crime de violação do direito autoral é alternativa, isto é, privativa de liberdade, de detenção, de três meses a um ano, ou multa.

A ação penal é pública de iniciativa privada (queixa). No caso de o sujeito passivo ser entidade de Direito Público, autarquia, empresa, sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo Poder Público, a ação penal é pública incondicionada.

A ação penal é de iniciativa privada tão-só no caput do art. 184 do Código Penal, continuando para o procedimento em vigor os arts. 524 a 530 do Código de Processo Penal, que prevêem procedimento especial prévio, sendo necessário que o ofendido ajuíze requerimento para a expedição de mandado de busca e apreensão do objeto material do injusto de violação, realizando-se a perícia para a sua comprovação, só quando então viabilizará a propositura da ação penal.

 

2.7. Figuras típicas qualificadas

Ocorrerá a figura qualificada em duas hipóteses: a) se a violação constituir-se na reprodução, por qualquer meio, de obra intelectual, no todo ou em parte, com o intuito de lucro, sem autorização expressa do autor ou de quem o represente; b) consistir na reprodução de fonograma e videofonograma, sem autorização do produtor ou de quem o represente.

Já vimos que o fundamento básico do direito patrimonial do autor se encontra na exploração econômica da obra. Para a realização do tipo qualificado, é requisito que o agente atue objetivando um lucro direto ou indireto de natureza patrimonial. Vale esclarecer a presença de elementos normativos do tipo (sem autorização expressa e sem autorização), bem como na avaliação do elemento subjetivo o especial fim de agir (animus lucri faciendi).

2.7.1. Reprodução com o intuito de lucro

Constatamos através de várias reformas específicas a preocupação em fortalecimento do direito do autor de obra intelectual. Registre-se que a Lei nº 6.895, de 17.12.1980, fez incluir dois parágrafos ao art. 184 do Código Penal, os quais vieram a ser revogados pela Lei nº 8.635, de 16.3.1993, tendo sido processada nova reforma pela Lei nº 10.695, de 1.7.2003. Aduza-se que a Lei nº 9.609, de 19.2.1998, já dispunha sobre a proteção da propriedade intelectual de programa de computador116 e sua comercialização, e no capítulo V define o injusto de violação de direitos de autor de programa de computador e regula ação penal mediante queixa e estabelece exceções.117 Pelo Decreto nº 2.894, de 22.12.1998, foram regulamentados a emissão e o fornecimento de selo ou sinal de identificação dos fonogramas e das obras audiovisuais, previstas no art. 113 da Lei nº 9.610, de 19.2.1998.

O tipo qualificado estatui que “se a violação constitui em reprodução (cópia) total ou parcial, com o intuito de lucro direto ou indireto (através de intermediário), por qualquer meio ou processo (técnica), da obra intelectual, interpretação, execução ou fonograma, sem autorização expressa do autor, do artista intérprete ou executante, do produtor, conforme o caso, ou de quem o represente”.118

Diante do verbo reitor reproduzir com o intuito de lucro (“pirataria”) há esfera de âmbito de mais reprovabilidade (reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa). Assim, é requerido que o obrar do sujeito ativo seja movido pelo animus lucri faciendi, direto ou indireto; caso contrário, deverá, na hipótese, incidir no caput do art. 184 do Código Penal. Se não há originalidade e já é do domínio público, inexiste incidência comportamental.

O injusto de reprodução não autorizada com o intuito lucrativo é material; a consumação ocorre com a real e efetiva reprodução, ainda que não tenha alcançado o lucro almejado (exaurimento).

Admite a tentativa.

2.7.2. Comercialização de obra intelectual

Cuida-se de tipo derivado composto de oito verbos reitores (distribuir, vender, expor à venda, alugar, introduzir no país, adquirir, ocultar e ter em depósito) que pune a realização da reprodução com o animus lucri faciendi, direto ou indireto, e sem a expressa autorização dos titulares dos direitos autorais ou de quem os represente.

Trata-se de norma penal em branco, pois as expressões normativas obra intelectual, interpretação, execução e fonograma têm seu conceito fornecido pela norma completiva da Lei nº 9.618/1998.

Cogita-se de reprodução não autorizada expressamente pelo titular dos direitos autorais, entendida como a multiplicação dos exemplares materiais da obra intelectual, objeto da proteção penal. Se o sujeito ativo obra sem o intuito de lucro, a conduta é atípica, ou desloca-se para o caput do art. 184 do Código Penal.

A nosso aviso, diante da expressão sem a autorização expressa do autor, estaríamos diante do consentimento justificante, pois o direito autoral está no grupo de determinados tipos de injustos, de bens jurídicos renunciáveis. A justificação requer um consentimento autorizado eficazmente.

Como já salientamos, o conceito de obra intelectual abarca as obras literárias, científicas, artísticas, programas de computador, coletâneas ou compilações, analogias, enciclopédias, dicionários, bases de dados e outras obras que por sua seleção, organização ou disposição de conteúdo constituam criação intelectual.119 Fonograma designa toda a fixação de sons de uma execução, interpretação de outros sons ou de uma representação de sons, que não seja uma fixação em uma obra audiovisual.120

Questão delicada é a que se refere à abrangência ou não da qualificadora à reprodução de videogames. Há duas correntes: a) haveria incidência comportamental tão-só no tipo fundamental, diante da proibição da interpretação extensiva ou da analogia in malam partem, com reflexos também na ação penal de iniciativa privada ao invés de pública;121 b) são apenas espécies de obras intelectuais, não se podendo deixar de dar a devida interpretação extensiva.122

A nosso sentir, seria um constrangimento lógico dar-se maior gravame da tutela aos fonogramas (CD’s) do que aos videogames (DVD’s) no combate à pirataria, sem olvidar que se trata de norma penal em branco que é completada pela Lei nº 9.610/1998.

As leis penais em branco, próprias ou impróprias, geram dificuldades hermenêuticas, pois os reenvios obrigam efetuar uma reconstrução preliminar dos conteúdos que são objeto de interpretação, risco que se acentua quando remete a normas extrapenais. A doutrina questiona sobre os problemas de inconstitucionalidade; porém, cabe indagar se poderíamos prescindir por completo diante da variedade de situações das quais depende a lesão do bem jurídico protegido por um tipo em branco. A nosso sentir, há bens jurídicos cuja integridade depende de circunstâncias conjunturais, de variações inevitáveis. A tendência atual é direcionada à exigência de que a ação e o resultado se encontrem especificados em lei formal e que seus complementos se realizem de conformidade com os princípios informadores do Direito Penal (usual principles of penal law), conciliando as exigências político-criminais com as necessidades práticas.122A

Túlio Lima Vianna, em direção contrária, sustenta que o autor nada perde com a cópia de sua obra, pois quanto mais pessoas lerem seus textos, ouvirem sua música e apreciarem a sua arte, tanto mais reputação ganhará na sociedade. Sustenta que, diante da natureza eminentemente privada e de seu caráter exclusivamente pecuniário, sua criminalização afronta os princípios de intervenção mínima e da vedação constitucional à prisão por dívida.122B

A modalidade qualificada exclui a hipótese de receptação, constituindo-se em participação posterior à consumação do injusto penal (Hungria fala em “concurso à execução do crime”).


Somente na modalidade de ocultar ou ter em depósito há o especial fim de agir (para o fim de venda), como requisito do elemento subjetivo do tipo que é permanente.

Trata-se, na modalidade de “expor à venda”, de tipo formal, unissubsistente. O elemento subjetivo do tipo, na modalidade de difusão de obra intelectual contrafeita, exige o conhecimento de que é produto de violação do direito autoral.

2.7.3. Violação se constitui no oferecimento ao público

Com a edição da Lei nº 10.695/2003, o legislador adequou a legislação aos avanços da tecnologia. Assim, acrescentou a terceira qualificadora: se a violação se constitui no oferecimento público, mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário realizar a seleção da obra ou a produção para recebê-la, com o intuito de lucro, direto ou indireto, sem autorização expressa, conforme o caso, do autor, do artista-intérprete ou executante, do produtos de fonograma, ou de quem o represente.

O sujeito ativo é próprio, pois no oferecimento ao público com o animus lucri faciendi, direto ou indireto, está o comerciante, que mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou através de outro sistema permite a seleção da obra.123

Guilherme de Souza Nucci lembra da violação do direito autoral pela internet, através do oferecimento ao público, com o animus lucri faciendi, de músicas, filmes e livros, proporcionando ao usuário da rede instalá-los em seu computador, lesando os direitos do autor.124

A Lei nº 7.646/87 acolheu a tese que já era ditada no plano internacional, proclamando o direito do autor sobre programas de computador e tipificando a comercialização indevida. Na mesma direção a Lei da Informática,124A que dispõe sobre a propriedade intelectual do programa de computador, entendendo que o regime de proteção é aquele conferido às obras literárias pela legislação dos direitos autorais e conexos que constitui a Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que atualizou e consolidou a legislação.

A Lei nº 11.723, modificada pela Lei nº 25.036, incluiu no conceito de obra protegida “os programas de computação fonte e objeto, as compilações de dados e de outras matérias”. A maioria da doutrina entende que o software estava implicitamente incluído na norma porque essa continha uma enumeração não-taxativa e ampla. Através do Acordo ADPIC do GATT, introduzido pela Lei nº 24.425, dispõe que “os programas de microcomputador, quer programas-fonte, quer programas-objeto, serão protegidos como obras literárias em virtude do Convênio de Berna (1971)”.

Não podemos olvidar que o programa de computador tem natureza de bem imaterial e contempla uma finalidade econômica que não afasta os aspectos morais do direito do autor.

Na primeira década do século XXI, o mundo caminha na direção do aperfeiçoamento na defesa dos direitos da propriedade intelectual. Não podemos esquecer que a internet, especialmente serviço de troca de arquivo sem provedor central (peer-to-peer), afeta a exploração de obras intelectuais, com maior relevância musicais, possibilitando a prática de violações ao direito dos autores, vedada na Carta Republicana.124B

Registre-se, nesta direção, nos Estados Unidos, a edição do “Digital Millennium Copyright Act” (1998). Na França, em 23 de novembro de 2007, foi celebrado acordo com produtores de audiovisuais, editores, provedores de acesso à internet e a plataforma de serviços on-line, objetivando medidas contra a violação dos direitos autorais (combate à pirataria).

No centro do questionamento jurídico está que a mesma força capaz de dar ao bem imaterial de propriedade intelectual status de bem em mercado, ao permitir a sua produção em escala, pode ser a mesma que dele retira o retorno econômico imediato, ao elevar os níveis de sua oferta. A evolução tecnológica impõe mudanças e adaptações na forma como o controle da propriedade intelectual (reprodução de músicas, filmes, programas de computador e de outros tipos de bens intelectuais que circulam pela internet).

A vertente de que a legislação brasileira deve mudar, flexibilizando em relação aos excessos de proteção os direitos autorais, não deve ser acolhida, mas, sim, incentivarmos uma maior fiscalização com a conscientização de repúdio ao produto pirata.

Note-se que o elemento subjetivo nas figuras qualificadas é o dolo, direto ou eventual, além do elemento especial do injusto consistente no intuito de lucro.

Para os nossos meios de comunicação, teoricamente, uma das formas alternativas para o controle da propriedade intelectual é o denominado copyleft, que se restringe às obras autorais, e não se aplica, pelo menos num modelo elaborado, aos bens imateriais industriais. O retorno para o autor viria com a sua divulgação e com a prestação de serviços (obras musicais, produção de shows, palestras e conferências).

A nosso sentir, deve-se repudiar a pura instrumentalização do direito de autor à política da informação, bem como a diluição do direito de autor numa direção genérica do direito da informação.

Nos tempos atuais, o direito de autor não tem como centro de gravidade o autor como pessoa física criadora no amplo espectro do exercício de sua liberdade de criação intelectual, mas antes as empresas que operam nos mercados da comunicação e da informação. Realmente, o autor não passa de um sujeito, fungível, na produção dos conteúdos informativos, que as empresas exploram pela distribuição junto de outras empresas e do próprio consumidor final.124C


2.8. Exceções ao direito do autor

O § 4º, do art. 184 do Código Penal, reza: “O disposto nos §§ 1º, 2º e 3º não se aplica quando se tratar de exceção ou limitação ao direito do autor ou os que lhe são conexos, em conformidade com o previsto na Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, nem a cópia da obra intelectual ou fonograma, em um só exemplar, para uso privado do copista, sem intuito de lucro direto ou indireto.”

A nosso aviso, tal dispositivo é rebarbativo, visto que explicitamente inaplicável às qualificadoras diante da ausência do dolo com o elemento subjetivo do injusto (animus lucri faciendi), sendo norma penal em branco, já destacada expressamente na Lei nº 9.610, de 19.2.1998.125 A conduta é atípica. No que tange à parte final (“...nem cópia de obra intelectual ou fonograma, em um só exemplar, para uso privado do copista, sem intuito de lucro direto ou indireto”), fora das hipóteses da Lei nº 9.610, de 19.2.1998, aplica-se ao caput do art. 184 do Código Penal.

2.9. Pena e ação penal

A pena privativa de liberdade cominada às qualificadoras126 é de reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.

No que concerne à ação penal, será de iniciativa pública incondicionada nas hipóteses previstas nos §§ 1º e 2º, do art. 184 do Código Penal, ou quando praticado em prejuízo de entidade de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou fundação instituída pelo Poder Público.127 No caso previsto no § 3º, do citado dispositivo legal, a ação penal é de iniciativa pública condicionada à representação.128

O Código de Processo Penal129 reza que: “Nos casos das infrações previstas nos §§ 1º, 2º e 3º, do art. 184 do Código Penal, a autoridade policial procederá à apreensão dos bens ilicitamente produzidos e reproduzidos, em sua totalidade, juntamente com os equipamentos, suportes e materiais que possibilitam a sua existência, desde que estes se destinem precipuamente à prática do delito.” Não há exigibilidade de sua perícia conduzida pelo perito do juiz;130 tão-só se requer que a análise do material apreendido tenha sido periciado oficialmente, ou por pessoa tecnicamente habilitada.131


RODAPÉS

100
Editado em 10 de setembro de 1710, o English Statute of Anne concedeu pela primeira vez aos autores de obras literárias o privilégio de reprodução pelo período de 14 anos, extinguindo o sistema de privilégios dos editores e impressores, que passaram a operar suas atividades desde que houvesse autorização dos autores através de contrato de cessão.

101
Art. 261 do CP/1830.

102
Art. 72, § 26, CF/1891.

 

103
Arts. 649 e 673 do CC/1916, que foram revogados pela Lei nº 9.610/1998.

103A
Art. 5º, XXVII, CF/88.

103B
Art. 5º, XXVIII, CF/88.

104
Art. 184 do CP/1940.

105
Art. 201 do CP/1969.

106
Art. 5º, XXVII, IX, X, XXVIII, CF/1988.

107
Neste sentido: Luiz Regis Prado, op. cit., 8, 609.

108
José Henrique Pierangeli, op. cit., 1.5, 194.

108A
Art. 40 da Lei nº 9.610, de 19.2.1998.

108B
Art. 52 da Lei nº 9.610, de 19.2.1998.

109
Art. 41 da Lei nº 9.610, de 19.2.1998.

110
Arts. 90 a 95 da Lei nº 9.610/98.

111
Neste sentido: Julio Fabbrini Mirabete, Manual de Direito Penal, Parte Especial, 22ª ed., São Paulo, Atlas, 2004, 18.1.5, 375.

111A
Art. 24 da Lei nº 9.610, de 19.2.1998.

111B
Art. 108 da Lei nº 9.610, de 19.2.1998.

111C
Arts. 24, § 3º, e 66, Lei nº 9.610, de 19.2.1998.

112
Nélson Hungria, op. cit., 184, 239.

113
Academia Brasileira de Letras Jurídicas, Dicionário Jurídico, 6ª ed., Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2000, 644.

114
Nélson Hungria, op. cit., 113, 338 e ss.

115
Nélson Hungria, op. cit., 183, 339.

116
Art. 1º da Lei nº 9.610, de 19.2.1998, define o que seja programa de computador para os efeitos legais.
 

117
Arts. 12, 13 e 14 da Lei nº 9.610/98.

118
Art. 184, § 1º, CP.

119
Art. 7º, XII e XIII, Lei nº 9.610/98.

120
Art. 5º, IX, Lei nº 9.610/98.

121
Delmanto, Código Penal Comentado, 7ª ed., Rio de Janeiro, Renovar, 2007, 563.

122
Guilherme de Souza Nucci, Código Penal Comentado, 5ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 12, 743.

122A
Enrique Cury, La Ley Penal em Blanco, Bogotá, Temis, 1998, 14, 58/59.

122B
Túlio Lima Vianna, “A Ideologia da Propriedade Intelectual (a inconstitucionalidade da tutela penal dos direitos patrimoniais do autor)”, in Revista da EMERJ, v. 8, nº 20, 2005, 89/108.

123
Em sentido contrário: José Henrique Pierangeli, op. cit., 16.4, 401, sustentando ser qualquer pessoa e até um ato isolado desde que realizado com o intuito de lucro.

124
Guilherme de Souza Nucci, op. cit., 22-B, 745.

124A
Lei nº 9.609, de 19.2.1998.

124B
Art. 5º, XXVII, CF/88, e arts. 46 a 48 da Lei nº 9.610/98.

124C
Alexandre Dias Pereira, “Conferência proferida no Arquivo da Universidade de Coimbra”, no dia 9 de abril de 2003, in Revista da ABPT, 64, maio/junho de 2003, 21/28.

125
Art. 46 da Lei nº 9.610/98.

126
Art. 184, §§ 1º, 2º e 3º, CP.

127
Art. 184, II e III, CP.

128
Art. 186, V, CP.

129
Art. 530-B do CPP.

130
Art. 527 do CPP.

131
Art. 530-D do CPP.


José de Oliveira Ascensão, Direito autoral, Rio de Janeiro, Forense, 1980, 1-2.


J. O. Ascensão, op. cit., 13-15.

Neste sentido: Candian.

Neste sentido: Planiol e Ripert.

J. O. Ascensão, op. cit., 261-336.

Paulo J. Costa Jr., Comentários ao Código Penal, Parte Especial, São Paulo, Saraiva, 1988, vol. 3, 4 e 5.

Art. 101 da Lei nº 9.610/98 e arts. 12 e 14 da Lei nº 9.609/98 (Propriedade intelectual sobre programas de computador).

J. O. Ascensão, op. cit., 50, 71.

Toda pessoa tem o direito à identidade, onde o poder público tem o dever precípuo de zelar pela estabilidade e segurança dos nomes dos cidadãos como meio de identificação e para a consecução de seus fins existenciais e cumprimento das respectivas obrigações. Os romanos tinham três nomes próprios: o prenome, o nome e o cognome (cognomen guia nomini conjungitur), e, às vezes, o agnome (quase accidens nomen). Já escrevia Papiniano: Falsi nominis vel cognominis adseveratio poena falsi coercetur. (Papiniano, lib. 15, Responsorum in Digestus, XLVIII, 10, 13, pr. Feiffé-Larcroix, La clef des lois romaines, II, Metz, 1810, 126). O nome civil é o que figura no registro civil.

A desapropriação é o procedimento administrativo pelo qual o poder público ou seus delegados, mediante prévia declaração de necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, impõe ao proprietário a perda de um bem, substituindo-o em seu patrimônio por justa indenização. A desapropriação desenvolve-se por meio de uma série de atos definidos em lei e que ao final geram a incorporação do bem ao patrimônio público. Tal procedimento legal compreende duas fases distintas: a) declaratória, em que o poder público declara de utilidade pública ou de interesse social o bem para fins específicos de desapropriação. Aliás, a declaração de utilidade pública gera de imediato os seguintes efeitos: 1) submete o bem à força expropriatória do Estado; 2) fixa o estado do bem; 3) confere ao poder público o direito de penetrar no bem a fim de fazer verificações; 4) dá início ao prazo de caducidade da declaração; b) executória, que engloba uma administrativa e uma judicial; compreende os atos através dos quais o poder público promove a desapropriação, isto é, medidas necessárias à efetivação da desapropriação pela integração do bem ao poder público. A Constituição Federativa de 1988 prevê ainda uma hipótese de desapropriação sem indenização, que incidirá sobre terras onde se cultivem plantas psicotrópicas legalmente proibidas. A desapropriação por utilidade pública fundamenta-se no artigo 5º, inciso XXIV, da CF/88. Quanto à natureza jurídica, podemos afirmar que a desapropriação é forma originária de aquisição da propriedade.



A expressão “domínio público” admite múltiplos significados: a) em sentido amplo designa o conjunto de bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno, políticas e administrativas; b) em sentido restrito, significa os bens afetados a um fim público, os quais compreendem os de uso comum do povo e os de uso especial (uso privativo de bem público por particular). Os bens públicos são coisas materiais ou imateriais, caracterizados por seu fim público e sujeitos, como tal, a regime jurídico especial, derrogatório e exorbitante do direito comum. Sabemos que a expressão bem público é menos abrangente obviamente do que domínio público. Os bens de uso comum eram considerados pelos romanos coisas públicas quisque de populo, inexistindo a obrigatoriedade de se ter permissão ou autorização, o que fazia coincidir com as res omnium, cujo bom exemplo são as bibliotecas públicas. O que caracteriza o bem público é a sua destinação.

Nélson Hungria, Comentários, cit., Rio de Janeiro, Forense, 1958, vol. VII, 113/339.

J. O. Ascensão, op. cit., 230, II, 297.

Quintano Ripollés, Tratado de la parte especial del Derecho Penal, 2ª ed., t. III, 623.

RT 601/341.

Neste sentido: Celso Delmanto, Código Penal comentado, 3ª ed. atualizada por Roberto Delmanto, Rio de Janeiro, Renovar, 1991, 333.

Neste sentido: Paulo José da Costa Jr., Direito Penal objetivo, Rio de Janeiro, Forense Universitária, 1989, 4, 401.

 


 

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